Presidente e CEO da Boa Vista Serviços, destaca necessidade de credibilidade e confiança para CIO buscar virada na carreira e detalha como sua experiência em TI contribui para gerir essa grande companhia
Por Mario Faria
Experiência diversificada, preparo, liderança, visão de negócio. São várias as características necessárias para que um executivo possa, em algum momento da carreira, assumir a presidência de uma companhia. E não importa o departamento de origem. Se vier de tecnologia da informação, existem algumas vantagens extras, como lembra Dorival Dourado, presidente e CEO da Boa Vista Serviços, em entrevista exclusiva para InformationWeek Brasil.
Ele já foi CIO, assumiu posição de gestão global na empresa anterior e, mais recentemente, topou o desafio de presidir uma companhia em formação que, após pouco mais de um ano de formação, já entrega resultados bastante interessantes.
Durante todo o bate-papo, ele frisou a necessidade de o executivo ter credibilidade, mencionou a força que um gestor de TI pode ter ao usar bem as informações e visão global do negócio que possui e, principalmente, a habilidade de formar uma boa equipe. A seguir, você confere os principais trechos da conversa.
InformationWeek Brasil – Como é fazer essa virada? Qual o principal desafio em deixar de ser CIO?
Dorival Dourado – Na realidade, a primeira coisa é querer. Apesar de gostar muito de TI, eu sempre procurei olhar tecnologia da informação como sendo um negócio e estruturar a TI como sendo um business que tinha que ter um nível de contribuição diferente para o negócio. E, a partir dessa forma de enxergar a TI, nós acabamos nos aproximando cada vez mais das áreas de negócio e tomando decisões de TI não baseadas em preceitos puramente técnicos, mas, principalmente, na estratégia da empresa. Não vou dizer que foi fácil, mas era uma tendência natural assumir atribuições na área de negócio.
IWB – Mas foi algo planejado, você almejava chegar à presidência de uma empresa?
Dourado – Dizer que foi planejado, arquitetado, não. Eu não queria ser um gestor de TI tradicional, que ficava entrincheirado em questões técnicas e falando coisas que a organização tem dificuldades de entender. Sempre pautei minha carreira por procurar fazer o melhor trabalho na posição em que estou alocado. Com isso, as coisas acabam surgindo naturalmente. Em minha opinião, quanto mais normal você encara sua questão de carreira – isso não pode ser um problema para você -, naturalmente as coisas surgem e as portas vão se abrindo.
IWB – Você citou que não queria ser um gestor técnico, mas acredito que nem exista mais espaço para isso. Você, na posição de CEO, contrataria alguém com esse perfil?
Dourado – Eu jamais contrataria um CIO técnico. O gestor de tecnologia da informação, ainda mais em nosso negócio, que vive e respira TI o tempo todo, precisa de um CIO que entenda de mercado, que possa ir junto com o executivo comercial visitar um cliente, passar toda a segurança técnica necessária e que, principalmente, olhe os recursos de TI e pense os desafios de infraestrutura e arquitetura olhando o crescimento e o desenvolvimento da companhia.
IWB – Que tipo de desafio você vê nessa migração ou maior dificuldade quando se assume um novo posto?
Dourado – O ponto principal é se despir dos vícios da TI, dos vícios do passado, essa questão de olhar para frente e como você contribui para geração de resultados. Principalmente, acho que o fato primordial em qualquer atividade é o respeito dos colegas e a credibilidade. As questões de credibilidade, transparência, liderança, são fatores decisivos para fazer qualquer tipo de crescimento ou transição de carreira.
IWB – Você acha que sua experiência diversificada (Serasa Experian, Abril, Eucatex) te ajudou a estar mais bem preparado para um cargo de CEO?
Dourado – Acho que são dois aspectos relevantes: primeiro a busca de conhecimento, o autodesenvolvimento, isso é fundamental. Trabalhei na indústria de mídia e procurei entender disso. Veio o advento da internet e entramos de cabeça. Aí vai para private equity, e você precisa entender do mundo de como desenvolver empresas. Então, o que é relevante é a busca pelo conhecimento.
Outro ponto importante é trabalhar com gente inteligente, é escolher sempre ou poder ter a chance de ter uma equipe, ter pares, ter líderes que te questionem o tempo todo e que sejam pessoas que tenham uma visão diferente de mundo, que reavalie a todo instante se estamos no momento e formato certos. Buscar esse relacionamento, aprender ou estar com a cabeça e o espírito aberto para aprender é fundamental.
IWB – E é difícil achar gente assim, não é?
Dourado – Eu diria que você tem que identificar. Acho que é fundamental você se relacionar com pessoas que têm uma visão de mundo em que você possa compartilhar ou refletir sobre suas verdades. Todo profissional precisa ter essa reavaliação contínua da linha estratégica, da forma como faz a gestão dos negócios, a gestão das pessoas. Equipe é fundamental, ter pessoas que também te ajudem a enriquecer, que você possa compartilhar visão e pessoas que tenham oportunidade de trabalhar em ambientes mais abertos e inovadores de forma a contribuir, porque é um aprendizado.
IWB – Você acha que todo CIO, em algum momento da carreira, deveria pensar em fazer algo fora da TI ou isso é uma questão de perfil?
Dourado – É claro que existem pessoas com propensão maior a ter essa flexibilidade. Mas mesmo àqueles CIOs mais tradicionais eu recomendaria essa possibilidade de poder navegar por outras áreas. Acho que o executivo de TI tem uma vantagem competitiva muito grande. Tem a possibilidade de conhecer a empresa por dentro, em todas as suas relações, em todas as suas interfaces. E se ele conseguir fazer uso desse conhecimento, em prol do negócio, ganhando credibilidade, fazendo com que a empresa tenha confiança no trabalho dele, acho que tem muito a ganhar como executivo.
IWB – Realmente ele acaba tendo uma visão do todo. Se conseguir gerar conhecimento e aplicar no dia a dia terá grande vantagem…
Dourado – Acredito que as pessoas têm que ter a cabeça aberta para pensar diferente, pensar fora da caixa e assumir riscos. É importante que as pessoas saiam da zona de conforto, testem seus limites. É claro que isso tem que ser feito de maneira pensada. E eu volto muito nessa questão de equipe, porque a gente não faz nada sozinho. Precisamos de gente que contribua e, na medida em que você abre o espaço para os seus liderados e dá as oportunidades, há uma troca muito boa no sentido de crescimento do grupo todo.
IWB – O fato de você ter vindo de TI faz com que você, como CEO, olhe o departamento de maneira diferenciada? Na Boa Vista, por exemplo, você criou o cargo de Chief Data Officer (CDO), que existe lá fora, mas não é comum por aqui.
Dourado – O profissional de tecnologia que sempre teve um pé em cada lugar, um na TI e outro no negócio, consegue enxergar com mais clareza como a tecnologia ou como os processos de inovação podem acelerar o desenvolvimento da empresa em que ele trabalha. Não que as outras áreas não sejam importantes, mas é tido como senso comum de que as companhias precisam muito de TI para se desenvolver. É claro que quando você tem visão estratégica da tecnologia, te ajuda a criar saltos qualitativos e quantitativos e dá ênfase a coisas ou aspectos do processo de negócios que, talvez, não chamaria tanta a atenção se você não tivesse esse conhecimento em profundidade.
Nossa companhia vive e respira tecnologia da informação, todas as nossas ofertas são baseadas em prestação de serviços que tem um software e um computador por trás. Isso ajuda muito na hora de você definir prioridades de investimento, de gerenciar, de contribuir para eliminar as restrições ou dificuldades. E você pode opinar com muita propriedade na redução do time to market ou em como eu desenvolvo um produto para um dos nossos clientes. Nossa capacidade de julgamento fica muito mais equilibrada.
IWB – Você participa de conversas frequentes com a TI na Boa Vista pra discutir produtos, por exemplo?
Dourado – Temos fóruns específicos para esse tipo de discussão, medimos grau de inovação em receita com novos produtos. Em nosso primeiro ano de vida, por exemplo, lançamos 35 produtos nessa área de serviços de crédito. Tudo isso é possível através de um ambiente favorável. Adotamos um modelo de inovação aberta, eu trabalho com isso há oito anos. Temos uma plataforma colaborativa de integração das diversas áreas da empresa, que chamamos de Rede Nós, que foi case do Harvard Business Review no Brasil, e deixamos isso também na empresa anterior. Estou trabalhando aqui, mas com um conceito melhorado. São coisas que, no fundo, contribuem para que o ambiente corporativo seja propício a esse desenvolvimento. Temos um índice de aproveitamento muito bom e modelos de contribuição para cada processo desenvolvido usando as áreas e de reconhecimento. Tudo isso é motivador.
IWB – Desde que você assumiu, quais foram suas realizações?
Dourado – Eu estava fora do Brasil quando recebi o convite para ocupar essa posição com o lançamento da Boa Vista, que foi em novembro de 2010. Nosso case está virando referência de mercado. Fizemos o processo de spin-off de uma operação que era suportada por uma entidade de classe sem fins lucrativos e hoje somos uma S/A de capital fechado. Com seis meses de vida incorporamos uma subsidiária de uma multinacional, saímos de 400 colaboradores e estamos perto de mil e isso num prazo de 12 meses. Crescemos acima do mercado no primeiro ano e com atuação nacional.
IWB – Uma vez você disse que a vida tem que ser construída em etapas e que não funciona como um road map. Isso também vale quando se assume a posição de CEO?
Dourado – Tenho certeza que sim. Claro que na empresa você tem que ter uma visão mais de longo prazo e entender que a gente só constrói qualquer obra – vamos olhar uma casa ou um prédio – pensando nas fundações. Isso é o que procuramos fazer em nossa companhia, deixando conceitos sólidos de ética, valores, missão, sustentabilidade, inovação, prestação de serviço ao cliente. Você tem que construir sua vida tijolo a tijolo, e a empresa também, apesar de uma visão mais de longo prazo. Quando falei isso, foi nesse sentido. Nunca almejei ou fiz um planejamento no sentido de querer ser o número um ou o presidente. Sempre procuro fazer o melhor naquilo que me é colocado como desafio.
O profissional tem que ser movido a desafios. O dia em que eu chegar na companhia e não tiver nada novo para fazer, começo a me desmotivar. Foi um pouco o que aconteceu. Eu tinha uma posição de destaque numa multinacional, desenvolvia produtos para 45 países, tinha perto de mil pessoas pelo mundo, mas esse desafio da Boa Vista foi muito interessante porque podia exercitar muito mais minha capacidade criativa, ampliar meus horizontes, colocar meu jeito de fazer as coisas de forma mais objetiva. Então, mesmo assumindo alguns riscos, eu decidi assumir esse desafio, sabendo que teria muito a contribuir e muito a aprender.
Fonte: InformationWeek
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